Caminho alternativo para negociar o tarifaço

Ives Gandra da Silva Martins defende ação do setor privado como alternativa para mitigar os efeitos do "tarifaço" imposto pelos EUA. (Foto: Andreia Tarelow)

Impasses na negociação com os EUA

Nas conversas que tenho mantido com empresários e, principalmente, com professores universitários de Direito e Economia, há um consenso de que o presidente Lula perdeu as condições de negociar o “tarifaço” com o presidente Trump, como fizeram outros países.

A essa altura, parece que o melhor caminho é a sociedade brasileira encontrar uma solução, pois o presidente Lula acredita estar crescendo politicamente por “defender a soberania brasileira”.

Soluções fora da esfera governamental

Ora, no caso do Brasil, soluções para reduzir os efeitos negativos do “tarifaço” devem ser negociadas, segmento por segmento, com empresários americanos que têm acesso à Casa Branca.

Essa ação se faz necessária, já que a política do governo de “dobrar a aposta” de forma permanente está trazendo sérios problemas para todos.

O papel da sociedade civil e dos setores produtivos

Em outras palavras, o povo, a sociedade, empresas, economistas e professores universitários precisam abrir um caminho fora da esfera do poder público para conseguir mitigar os efeitos negativos sobre a economia brasileira.

É preciso defender o bem-estar do povo, os empregos, combater a inflação e permitir o desenvolvimento.

Precedentes positivos na indústria

A impressão que tenho é de que, desse modo, algo será conquistado. Há setores que estão melhorando. Percebe-se que a indústria de carne e café são capazes de conseguir redução das tarifas.

Outras empresas e setores já conseguiram o mesmo, o que serve de precedente. Além disso, a redução de tarifas também afeta a economia americana, o que pode facilitar um acordo.

A lógica da tarifação de Trump

É certo que a estratégia do presidente Trump de criar uma tarifa para depois acordar sua diminuição pode ter provocado negociações com todos os países. A ideia não era punir as outras nações, mas sim obrigá-las a reduzir suas tarifas.

Tarifas brasileiras: altas e contraditórias

No nosso caso, porém, a intenção pareceu ser a de punir. Temos uma das mais altas tarifas alfandegárias do mundo, superando inclusive a Índia.

Em última análise, o Brasil é uma nação que impõe muitos tributos, mas não quer que os mesmos lhe sejam impostos.

A responsabilidade agora é do setor privado

A solução deve, portanto, vir do setor privado, do povo e da sociedade. Isso porque o governo perdeu as condições de diálogo com a sua política de “dobrar a aposta”.

Juros altos e desconfiança no governo

Estou convencido de que, apesar do momento complicado que enfrentamos, teremos que manter os juros em um patamar elevadíssimo; em 10% ao ano, em termos reais. E temos esse juro real elevado porque não se confia que o Brasil, com o endividamento que segue crescendo no governo do presidente Lula, terá condições de pagar a dívida.

Juro real é o ganho que, de fato, se obtém sobre a aplicação do dinheiro.

Comparação com a dívida americana

Embora a dívida brasileira ainda seja inferior à dos Estados Unidos, a economia deles é a mais forte do mundo. No entanto, a dívida do Brasil é, talvez, a maior entre os países em desenvolvimento.

Ora, se eu tenho dinheiro e não confio em um país, só vou arriscar meu capital se houver juros elevados. Ao dar juros altos, o país amplia a atração de investimentos.

Brasil: país de especulação, não de investimento

Por isso, os juros reais de 10% no nível do sistema financeiro são elevadíssimos, até porque o Brasil, em vez de ser um país de investimento, é um país de especulação.

Os países são divididos em investidores e especulativos. Nós, por exemplo, estamos em terceiro grau em nível especulativo.

As pessoas percebem que a má administração da política econômica prejudica o povo, a nação, o desenvolvimento e o crescimento.

Galípolo e a política econômica

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, está realizando uma política econômica de certo modo adequada. Ele é o verdadeiro responsável por segurar a inflação, enquanto o presidente Lula aumenta a pressão sobre ela.

Negociações diretas: setor por setor

Por isso, me parece fundamental que os setores privados, com acesso a empresários estadunidenses, que tenham trânsito na Casa Branca, trabalhem intensamente, setor por setor, conforme a necessidade de cada um, para conseguir a redução de tarifas, o que algumas empresas já obtiveram e que outras estão em vias de conseguir.

Isso seria bom para o Brasil e aliviaria um pouco a situação.

Discurso político vs. realidade econômica

Não tenho esperança de que o governo Lula mude de atitude, pois parece que ele ganhou alguma aprovação ao “defender a soberania nacional” contra os Estados Unidos, além da divulgação da narrativa dos “pobres contra os ricos” e de que os ricos devem ser punidos pelos pobres.

Fato é que todos os países que negociaram conseguiram baixar as tarifas aplicadas pelos Estados Unidos. O Brasil é o único que não consegue negociar, pois o discurso político está influenciando diretamente o discurso econômico.

Sobre o autor:

Ives Gandra da Silva Martins defende ação do setor privado como alternativa para mitigar os efeitos do “tarifaço” imposto pelos EUA.
(Foto: Andreia Tarelow)

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região.
Professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia).
Doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS.
Catedrático da Universidade do Minho (Portugal).
Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio – SP.
Ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

Jornalista responsável: Gabriela Romão – RV Comunicação 
Fotos: Andreia Tarelow

Por: Ives Gandra da Silva Martins